Em agosto, ocorreu um congresso voltado para advogados e engenheiros, em que o tema central era a discussão sobre o elevado número de demandas judiciais contra construtores tramitando no judiciário brasileiro. Um assunto relevante, pois assim como foi comentado, vejo que muitas coisas dão margens e se transformam em processos. Tudo, infelizmente, tende ao litígio. Contudo, como uma moeda, tudo tem dois lados. Ao avaliar no judiciário, os números de processos cíveis são estrondosos, mas ao avaliar a engenharia, vemos um crescente número de profissionais atuando com diagnóstico e perícia. Então, será que advogados e engenheiros estão banalizando e fomentando novas demandas? Achei interessante a fala de um responsável pela CBIC, que informava que quando há a constatação de uma anomalia em uma edificação, as etapas comuns para solução definitiva ou para entendimento da responsabilidade seria:
- acionar a Caixa Econômica Federal;
- a caixa econômica acionar a construtora;
3.a construtora entrar em contato com o cliente para avaliar o apontamento;
- e se constatado o vício pela equipe da construtora, haverá a correção, se não, deve haver o repassasse da responsabilidade para o cliente por falta de manutenção ou mau uso.
Entretanto, ao confrontar a realidade das pessoas que adquiriram seus sonhados imóveis pelo programa do governo, as etapas — simples— para correção da anomalia não são tão funcionais assim. Ambos os lados — construtora x cliente — precisam passar por uma avaliação e por um ―julgamento‖ com o olhar tão crítico, como o que foi apresentado no congresso, não apenas financeiro, mas também humano. Ao se fazer um paralelo entre o número de ações que tramitam pelo judiciário relacionados a vícios construtivos, e a satisfação dos clientes em relação ao bem adquirido, será possível entender que não se trata, apenas, de advogados ou engenheiros ―querendo levar vantagem‖. Temos sim um grande rombo na qualidade ao produzir e entregar engenharia. A tentativa de economizar centavos por unidade construída direciona os construtores a negligenciar e a deixar de lado, quesitos normativos importantes e essenciais, que interferem na durabilidade dos sistemas construtivos. Acompanhei recentemente, como assistente técnica, um processo judicial que havia como pleito a correção dos vícios construtivos. Uma das assistentes técnicas, em tom irônico, acreditava ser um absurdo cobrar o atendimento das normas técnicas, afinal, as pessoas estavam adquirindo um imóvel de um programa do governo. Outra frase que me chamou a atenção , e que por coincidência foi falada durante o congresso, era que: ― a cobrança sobre os vícios impactava na entrega do tão sonhado imóvel‖. Entendo que sobrecarregar o judiciário com questões de engenharia não é, e nunca será, a solução para os problemas enfrentados nos condomínios, casas e apartamentos. Entretanto, a quem recorrer quando a resposta mais ouvida é ―está fora de garantia‖? ou quando é preciso lidar com profissionais robotizados para avaliar falhas que eles mesmos não entendem?
A palavra “banalizar” usada para justificar os elevados números de processos, pode ser usada também quando observamos os inúmeros lançamentos de entregas de imóveis para o mercado sem o mínimo crivo das normas técnicas.
A mesma conta que apresenta um aumento de 125% nos custos relacionados à correção e manutenção por parte das construtoras, poderia ser revertida em remunerações adequadas aos engenheiros, em contratação de projetos como fachada, impermeabilização, drenagem, em contratação de mão de obra qualificada e materiais
com durabilidade condizente ao tipo de público (pensando serem clientes com baixo poder aquisitivo, e que os materiais empregados tenham o mínimo de manutenção durante a vida útil do condomínio). Sendo assim, a discussão não pode estar limitada ao setor judiciário e aos impactos gerados no bolso das construtoras, mas também ao lado otimista desse cenário, fazendo um paralelo com o imenso crescimento de estudos das patologias das construções e os sonhos das pessoas que os adquiriram, essas que merecem usufruir de um empreendimento íntegro por aqueles que buscam construí-lo cada vez melhor.